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Agnelo Queiroz e ex-secretária de Saúde são condenados por improbidade administrativa

O ex-governador Agnelo Queiroz e a ex-secretária de Saúde Marília Coelho Cunha foram condenados por improbidade administrativa por terem dobrado a carga horária de Agnelo, que é médico da Secretaria de Saúde do DF, no fim do mandato dele, em 29 de dezembro 2014. Eles terão de devolver, com correção monetária e juros, os valores acrescidos à remuneração do médico desde a alteração da jornada de trabalho. Marília também foi condenada ao pagamento de multa civil equivalente ao dano causado, à perda do cargo público que ocupa atualmente e à suspensão dos direitos políticos por cinco anos. A decisão é do juiz titular da 4ª Vara de Fazenda Pública do Distrito Federal, Roque Fabrício Viel, e foi proferida no fim de fevereiro de 2017.

De acordo com a ação ajuizada pelo Ministério Público do Distrito Federal, em 29 de dezembro de 2014, a ex-secretária expediu, sem requerimento por parte de Agnelo nem processo administrativo, portaria sem número duplicando a carga horária de trabalho do ex-governador de 20 para 40 horas semanais a partir do fim de seu mandato. No entanto, o MPDFT destacou que não havia justificativa para dobrar a jornada, pois Agnelo nem sequer voltou ao trabalho de imediato – ele gozou férias e dois períodos de licença-prêmio depois do fim do mandato eletivo. O órgão apontou ainda que é vedado pagar jornada de 40 horas a servidor em gozo de licença-prêmio.

 

Defesa

A ex-secretária de Saúde Marília Coelho Cunha alegou que não era necessário pedido do servidor, pois a carga de trabalho já estava incorporada na relação jurídica. Afirmou que a portaria se baseou no Decreto 25.324/2004 – que autoriza o regime de 40 horas na administração pública do DF – e que essa norma se aplica também ao servidor afastado para mandato eletivo. Acrescentou que todas as condições foram observadas, sendo desnecessário instaurar processo administrativo.

Já o ex-governador Agnelo Queiroz sustentou que o Decreto 27.373/2006 alterou o decreto de 2004, permitindo que o servidor exonerado de cargo em comissão pudesse optar por manter a carga horária de 40 horas semanais. Defendeu não haver ilegalidade na portaria, pois o mandato eletivo se assemelha a cargo comissionado. Além disso, ressaltou que, no exercício do mandato eletivo, cumpriu jornada muito superior a 40 horas.

 

Governador não é cargo comissionado

No entanto, para o juiz Roque Fabrício Viel, mandato eletivo não se confunde com cargo em comissão, pois são formas bastante diferentes de ocupação de cargos públicos e a distinção é “bastante evidente”. O cargo de governador, segundo Viel, se reveste de status de agente político, com tempo definido e limitado, enquanto os cargos comissionados não possuem limite de tempo nem estabilidade. Além disso, o magistrado destacou que o acesso ao cargo de governador se faz por meio de eleição. Já a nomeação em cargos comissionados se dá em razão da relação de confiança estabelecida entre o nomeante e o nomeado.

“A alegação de Agnelo de que, ao ser eleito, recebeu ‘efetiva demonstração de confiança’ para conduzir o Poder Executivo, como se o governador fosse uma mero comissionado dos eleitores, mostra-se equivocada. Tal raciocínio, com a devida vênia, trata com menoscabo o cargo de governador. Aliás, se o governador do Distrito Federal fosse mero comissionário dos eleitores, como se aventou, então deveria poder ser demitido ad nutum em caso de quebra da confiança, tal como os servidores comissionados comuns. Só que isso, evidentemente, não é possível”, explicou Roque Fabrício Viel na sentença.

Por essa razão, o juiz entendeu que a analogia é indevida e que não é aplicável ao caso o artigo 9º do Decreto 25.324/2004, que trata exclusivamente do retorno do servidor efetivo exonerado de cargo comissionado. Para o magistrado, o dispositivo, ao permitir que o servidor opte por manter a jornada de trabalho de 40 horas semanais ao retornar ao seu cargo efetivo justifica-se pela possibilidade de que ele mantenha a mesma carga horária do cargo comissionado, aproveitando-se sua disponibilidade para o serviço. “Há benefício, em tese, para o servidor e para a Administração. Tal justificativa, contudo, não se aplica ao governador, que sequer tem carga horária definida e que não pode ser comparado a um servidor comum, porque é agente político”, pontuou.

 

Carga horária

Na sentença, o juiz Roque Fabrício Viel enfatiza que Agnelo Queiroz não foi “exonerado” do cargo de governador – como sustentou a defesa, a fim de enquadrar o caso no decreto de 2004 – mas retornou ao cargo efetivo de médico após o término do mandato eletivo. “Vale salientar, ainda, que a portaria autoriza o ‘retorno’ do servidor à jornada de 40 horas, sendo que ele jamais cumpriu essa carga horária. A jornada estabelecida em seu regime é de 20 horas e o governador não está sujeito ao cumprimento de carga horária pré-definida”, esclareceu o magistrado.

Sobre a falta de processo administrativo para avaliar a concessão de aumento na jornada, Viel sublinhou que o fato demonstra que não houve análise do impacto da medida, conforme prevê o artigo 2º do Decreto 25.324/2004. A norma determina que é preciso haver estimativa de custos e declaração de disponibilidade financeira.

 

Por que a pressa?

Apesar de a defesa dos réus alegar que o ato normativo foi regular, o magistrado se baseou no fato de que a portaria foi editada sem numeração, no antepenúltimo dia do mandato de Agnelo Queiroz, e não foi publicada no Diário Oficial. Para Roque Viel, esses aspectos reforçam a tese do Ministério Público de que a portaria foi feita apenas para beneficiar pessoalmente o ex-governador.

“A pressa, aliás, não encontra outra explicação se não essa, a de garantir a vantagem a Agnelo, até porque ele não retomou suas atividades de imediato. Após o término do mandato, gozou licença prêmio e períodos de férias. Qual, então, a necessidade de se conferir jornada de 40 horas a um servidor que somente retornaria ao serviço efetivo meses depois, se não a de lhe conferir acréscimo remuneratório?”, rebateu o magistrado na sentença.

Com essa análise, o juiz titular da 4ª Vara de Fazenda Pública do Distrito Federal verificou estar configurado o ato de improbidade previsto no artigo 11 da Lei 8.429/1992 e condenou o ex-governador Agnelo Queiroz e a ex-secretária Marília Coelho Cunha a ressarcirem o dano causado ao erário pela duplicação da carga horária do médico. O valor ainda será definido e haverá correção monetária e juros de mora. Marília, atualmente servidora da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), foi condenada ao pagamento de multa equivalente ao dano, à perda do cargo público que ocupa atualmente e à suspensão dos direitos políticos por cinco anos.

Cabe recurso da decisão.